O sentido da vida é aquele que escolhemos dar a ela.
Pontos principais:
- Acreditar em uma vida eterna após a morte pode apenas adiar a busca por um propósito verdadeiro.
- A ausência de um propósito pré-definido não significa que a vida seja vazia de significado.
- Mesmo em meio à dor, ao absurdo ou à desesperança, é possível atribuir valor e sentido à existência.
A pergunta sobre o sentido da vida é, talvez, uma das mais incômodas que podemos fazer a nós mesmos — não tanto pela resposta, mas pelo medo de que talvez não haja uma.
Ainda hoje, muitas pessoas acreditam que a humanidade foi criada por uma entidade sobrenatural, chamada Deus, e que essa criação teve um propósito inteligente, o qual seria o verdadeiro sentido da vida.
Neste texto, não pretendo repetir os argumentos clássicos a favor ou contra a existência de Deus, tampouco tomar partido. No entanto, mesmo que Deus exista e tenha tido um objetivo ao nos criar, a verdade é que não sabemos exatamente qual seria esse propósito — ou se ele realmente teria algum valor significativo para nós.

A Segunda Lei da Termodinâmica afirma que a entropia de um sistema fechado — como o próprio universo — tende a aumentar até alcançar o equilíbrio. Sendo assim, o suposto propósito divino da nossa existência pode ser tão simples quanto acelerar esse processo, assim como fungos e microrganismos ajudam na decomposição da matéria orgânica. Em outras palavras, talvez sejamos apenas catalisadores naturais — como enzimas complexas dentro de um sistema maior.
Por Que É Melhor Não Ter um Propósito Pré-Definido
Se o suposto propósito que nos foi dado por Deus for apenas o de agir como dissipadores de calor altamente eficientes, então talvez seja melhor não termos propósito algum. Isso porque a ausência de um propósito predeterminado nos liberta — permitindo que sejamos os autores do nosso próprio significado e, assim, possamos viver vidas verdadeiramente dignas e com propósito.
Seguindo essa linha de raciocínio, não ter um propósito é, na verdade, preferível a qualquer forma de propósito fixado de antemão, mesmo aqueles mais tradicionais e elevados, como servir a Deus ou buscar melhorar nosso carma.
Em outras palavras, mesmo que Deus exista e tenha tido alguma intenção inteligente ao nos criar (o que não é uma certeza nem uma obrigação), nós simplesmente não sabemos qual seria esse propósito. E, qualquer que ele seja, é possível — e talvez até desejável — que sejamos capazes de ignorá-lo, rejeitá-lo ou, ao menos, colocá-lo de lado.
Afinal, se não formos livres para construir e escolher nosso próprio caminho, nosso propósito de vida pode ser, na melhor das hipóteses, incompreensível e alheio à nossa vontade — e, na pior, absolutamente irrelevante.
Objeções Comuns à Ideia de um Propósito Autônomo
Talvez você — ou outras pessoas — pense que não ter um propósito pré-definido equivale, na prática, a não ter propósito algum. Essa visão parte da ideia de que, para algo ter sentido, é necessário que tenha sido criado com um objetivo específico em mente e que ainda esteja servindo exatamente a esse propósito original.
Mas será que isso é mesmo verdade?
Pense, por exemplo, em uma garrafa de vidro descartada que alguém encontra em um terreno baldio. Originalmente, ela foi criada para armazenar alguma bebida — esse era o seu “propósito” inicial. No entanto, ao ser recolhida, limpa e transformada em um belo vaso para flores, ela ganha uma nova função, totalmente diferente da original, mas ainda assim cheia de valor e beleza. A garrafa não foi “criada” para ser um vaso, mas isso não impede que essa nova utilidade seja significativa.

Agora, imagine um aplicativo de celular projetado para rastrear atividades físicas. Um usuário, porém, começa a utilizá-lo como ferramenta de registro emocional, anotando ali como se sentiu após cada caminhada ou corrida. A função para a qual o app foi criado (monitorar dados físicos) continua existindo, mas ele passa a cumprir também um novo papel subjetivo e transformador — não previsto por seus criadores, mas profundamente útil para quem o utiliza dessa forma.
Esses exemplos mostram que o propósito não precisa estar ligado à intenção original de criação. Algo — ou alguém — pode adquirir significado ao longo do tempo, em novas situações, de maneiras que nem sempre estavam previstas ou determinadas.
Ainda assim, há quem diga que buscar o sentido da vida é inútil, pois a existência terrena seria apenas uma preparação para uma suposta vida eterna após a morte. Nessa visão, o verdadeiro propósito estaria além deste mundo.
Mas há boas razões para questionar esse ponto de vista:
- Não há garantias de que uma vida após a morte realmente exista — muito menos de que ela preserve a continuidade da nossa consciência individual.
- Mesmo que existisse uma vida eterna, a eternidade por si só não configura um propósito. Apenas empurra a questão adiante: afinal, qual seria o sentido da própria eternidade?
- Apostar apenas na vida futura frequentemente nos desmotiva a buscar propósito na vida presente — que, até prova em contrário, é a única que temos.
- Se é a finitude da vida que lhe confere urgência e significado, como propôs o filósofo Bernard Williams, então uma existência eterna pode ser, paradoxalmente, desprovida de direção ou propósito.
Portanto, independentemente da existência de Deus, de um plano divino ou de uma vida após a morte, o caminho mais autêntico e enriquecedor é criarmos nós mesmos os nossos propósitos.
Se quisermos usar uma metáfora existencialista inspirada em Sartre, podemos dizer que, para o vaso feito de garrafa, “a existência precede a essência” — ele passou a ter um propósito depois de já existir. No caso do aplicativo, “a essência precede a existência” quando é usado como originalmente pensado, mas “a existência precede a essência” quando ele ganha uma nova função — mais significativa para quem o utiliza de forma criativa.
Nós, seres humanos, podemos ser como o vaso ou como o aplicativo: podemos descobrir ou reinventar nossos propósitos. E é justamente essa liberdade de escolha que torna a vida tão profundamente significativa.
A Importância do Sentido — e Como Escolhê-lo
Platão certa vez definiu o ser humano como um animal bípede, sem penas e com unhas largas — definição que, curiosamente, exclui galinhas depenadas. Mas entre suas ideias mais significativas, talvez esteja esta: o ser humano é “um ser em busca de sentido”.

Ainda que a vida humana não tenha surgido com um propósito pré-estabelecido, isso não significa que não possamos atribuir a ela um propósito — e até um que seja mais valioso e significativo do que qualquer propósito imposto de fora.
Assim, o sentido da vida — da nossa vida — é aquele que escolhemos dar a ela.
Mas como escolher esse sentido?
No livro “Em Busca de Sentido”, o psiquiatra e neurologista Viktor Frankl relata sua experiência como prisioneiro em campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
De forma impactante, Frankl observou que os sobreviventes não eram, necessariamente, os mais fortes fisicamente, mas sim aqueles que conseguiam manter uma sensação de controle interno diante da realidade brutal que os cercava.
Ele escreveu:
“Nós, que vivemos em campos de concentração, lembramo-nos dos homens que passavam pelas barracas confortando os outros, oferecendo o último pedaço de pão. Eles podem ter sido poucos, mas são prova suficiente de que tudo pode ser tirado de um homem, exceto uma coisa: a última das liberdades humanas — escolher sua atitude diante de qualquer circunstância, escolher seu próprio caminho.”
A mensagem de Frankl é, em essência, uma mensagem de esperança: mesmo nas situações mais absurdas, dolorosas e desumanas, a vida ainda pode ter sentido — inclusive o sofrimento.
Sua experiência o levou a concluir que o impulso fundamental do ser humano não é o prazer (como pensava Freud), nem o poder (como afirmava Adler), mas o sentido.
Após sua libertação, Frankl fundou a logoterapia, cuja palavra vem do grego logos — que pode significar “sentido”, “razão” ou “princípio”. Considerada a terceira escola vienense de psicoterapia (após Freud e Adler), a logoterapia busca ajudar o indivíduo a encontrar um significado profundo para sua vida por meio de uma análise existencial.
Segundo Frankl, podemos encontrar sentido de três formas principais:
- Vivenciando a realidade de forma autêntica, por meio de relações humanas e da experiência com o mundo;
- Contribuindo com algo significativo, seja pela criatividade, pelo trabalho ou pela expressão pessoal;
- Mudando nossa atitude frente ao inevitável, quando não conseguimos alterar as circunstâncias externas.
Conclusão: O Poder de Escolher o Seu Propósito
A busca pelo sentido da vida pode parecer, à primeira vista, uma jornada abstrata ou até angustiante. No entanto, como vimos ao longo deste texto, a ausência de um propósito pré-definido não é uma falha da existência — é, na verdade, a sua maior dádiva.
Não ter um “destino traçado” nos liberta para criarmos nosso próprio caminho, com base em nossas experiências, valores e escolhas. É nessa liberdade que reside a dignidade da vida humana.
Se há algo que a filosofia existencial, a psicologia de Viktor Frankl e até os exemplos simples da vida cotidiana nos mostram, é que o verdadeiro propósito nasce de dentro para fora. Ele é construído nas nossas atitudes, nos vínculos que criamos, nas causas que abraçamos e na forma como enfrentamos o sofrimento inevitável da existência.
Você não precisa de uma resposta universal para o sentido da vida. Precisa apenas encontrar um sentido que faça a sua vida valer a pena ser vivida — e esse sentido pode (e deve) ser único, dinâmico e autêntico.
No fim das contas, como dizia Frankl, “não é o que esperamos da vida, mas o que a vida espera de nós.” Que tal começar a responder a essa pergunta hoje?
Gostou da reflexão? Compartilhe com alguém que também esteja em busca de sentido. Ou conte nos comentários: o que dá sentido à sua vida hoje?
Com Conteúdo de Psychology Today.

Olá! Eu sou o Eduardo Feitosa, criador do Mundo Filosófico. Minha paixão pela filosofia nasceu do desejo de entender melhor o mundo, as pessoas e, claro, a mim mesmo. No blog, meu objetivo é tornar conceitos filosóficos acessíveis e descomplicados, trazendo reflexões profundas de uma forma clara e prática.






